Crítica | Águas Rasas
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Desde o lançamento do suspense
Tubarão, de Steven Spielberg, são muito raros os filmes que tem o predador-título
como ameaça que não caem no ridículo (Sharknado está aí para provar o que estou
falando). Felizmente, Águas Rasas, ao longo de seus bem aproveitados 86 minutos
de duração, obtém resultados satisfatórios e surpreendentes.
Sendo este um filme de
sobrevivência, a premissa é bastante simples: uma surfista norte-americana
(Blake Lively) viaja até uma praia paradisíaca no México, onde é atacada por um
tubarão e precisa lutar pela sua sobrevivência. No entanto, longe de qualquer
obviedade, o roteiro de Anthony Jaswinski entrega as informações sobre a
protagonista ao longo do filme, respeitando a inteligência do espectador. Com
isso, sabemos que a personagem se chama Nancy Adams e é uma jovem estudante de
Medicina em conflito com sua vocação após a perda trágica de sua mãe. Nancy vai
até aquela praia porque foi o mesmo local que sua mãe, também surfista,
descobriu que estava grávida dela.
Comparar Águas Rasas com o
clássico dirigido por Spielberg não só é injusto como também não é a melhor
comparação a ser feita. Enquanto o veterano diretor de Os Caçadores da Arca
Perdida e E.T. - O Extraterrestre estava interessado em criar uma atmosfera
através da ameaça representada pelo predador, o diretor Jaume Collet-Serra está
interessado no estudo de personagem. Colocando o tubarão totalmente em segundo
plano, Collet-Serra está interessado em fazer com que o público se importe com
Nancy e torça para que ela consiga escapar com vida. Este não é um filme feito
com o propósito de provocar sustos, mas sim uma narrativa na qual o dispositivo
que precisa ser acionado para funcionar (como em toda boa história) é a empatia,
e que funciona com sucesso em Águas Rasas.
Outra opção narrativa bastante
acertada de Collet-Serra é a forma como as novas tecnologias são apresentadas
com o propósito de auxiliar na narrativa. Com isso, vemos uma câmera GoPro utilizada
pelos dois surfistas locais para documentar suas manobras que, mais tarde, vai
servir para que a protagonista grave uma mensagem para sua família; um sistema
de mensagens de texto semelhante ao WhatsApp, através do qual Nancy se comunica
com a amiga que a deixou sozinha na aventura; um aplicativo de conversa em
vídeo que lembra o Skype utilizado na conversa de Nancy com seu pai e sua irmã;
além do álbum de fotos da mãe da jovem em seu celular. Sobre tecnologia, ainda
há um diálogo interessante no início do filme entre Nancy e seu guia, no qual
ele sugere que a moça se desconecte um pouco da vida virtual e admire o local a
sua volta. Um diálogo sutil, que mostra o quanto a geração pós-moderna está
deixando de ter experiências realmente significativas por viver na frente de
uma tela o tempo todo.
Como disse anteriormente, Águas
Rasas funciona tão somente pela empatia do público com a protagonista, e Blake
Lively realiza um bom trabalho ao representar o sofrimento de Nancy e o pavor
que ela sente diante das ofensivas do tubarão. Nesse sentido, é curiosa a
escolha de Collet-Serra ao rodar a sequência em que o tubarão ataca um
transeunte que estava roubando as coisas de Nancy a partir do ponto de vista da
moça, evidenciando o horror estampado no rosto dela e que é muito bem
reproduzido pela atuação de Lively. Por outro lado, um dos elementos que sabota
Águas Rasas é justamente a artificialidade de seu tubarão. Gerado a partir de
CGI, o tubarão consegue ser convincente em sua dimensão, o que
não acontece quando ele é exposto em toda sua glória. Além disso, a
artificialidade da criatura prejudica até mesmo o terceiro ato do filme. Como
se não bastasse os momentos finais terem sido concebidos e realizados de
maneira problemática, o clímax do filme é tão desastroso que sua resolução
chega a ser risível.
Amparado por uma boa atuação de
Blake Lively, Águas Rasas é um filme cujos méritos residem no desenvolvimento
de uma protagonista que desperta o interesse do público e nas escolhas
narrativas que agregam valor à história que está sendo contada. Ainda que o
filme peque em aspectos técnicos e isso acabe por prejudicar na hora de
provocar tensão, Jaume Collet-Serra e companhia merecem crédito por pelo menos
tentarem bravamente entregar um produto final diferenciado.