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Crítica | Assassin's Creed


O maior exemplo de um filme que utilizou com eficiência o recurso de linhas temporais distintas dentro de sua narrativa é O Poderoso Chefão 2. Era necessário retratar a juventude e ascensão de Don Vito Corleone para entender o porquê de seu filho, Michael Corleone, lutar com tanto empenho para defender os negócios de sua família. Se em O Poderoso Chefão 2 as linhas temporais paralelas funcionavam como uma ferramenta narrativa, em Assassin's Creed elas soam como uma desculpa para preencher lacunas.

Baseado no famoso game homônimo da Ubisoft (que também produz o filme), a narrativa acompanha duas linhas temporais. No presente, somos apresentados à Callum Lynch (Michael Fassbender), um criminoso condenado à morte cuja execução foi forjada para que fosse encaminhado aos cuidados da Fundação Abstergo, liderada por Alan Rikkin (Jeremy Irons). Lynch é logo usado como cobaia nos experimentos da Dra. Sofia Rikkin (Marion Cotillard), que conecta sua mente em uma máquina chamada Animus, capaz de reavivar memórias genéticas dos antepassados de quem está conectado à máquina.

Nisso somos transportados para o ano de 1492, época do auge da Inquisição, na qual a Ordem dos Cavaleiros Templários e o Credo dos Assassinos lutavam entre si pela Maçã do Éden, instrumento da primeira desobediência do homem a Deus e que pode ser a chave para conter o livre-arbítrio. Nesse cenário, conhecemos Aguilar de Nerha (também interpretado por Fassbender), membro do Credo dos Assassinos que consegue se apoderar da Maçã do Éden e luta para se manter um passo à frente de seus perseguidores. Com isso, a Fundação Abstergo intenta localizar a Maçã do Éden através do resgate das memórias de Aguilar, usando a mente de Lynch para alcançar seus objetivos.

Como sugeri nos parágrafos acima, Assassin's Creed não entrega um espetáculo satisfatório. No entanto, isso não significa que o filme não tenha suas qualidades. Uma das coisas mais admiráveis e inesperadas em uma narrativa é quando seus subtextos saem do terreno do implícito e ficam mais evidentes para o espectador. Por exemplo, em uma cena na qual estão dialogando Alan Rikkin com uma das líderes dos Templários, interpretada por Charlotte Rampling, ao discutirem sobre livre-arbítrio e liberdades em geral, a última diz uma fala que, infelizmente, reflete muito o tempo em que vivemos: "Estamos em 2016, ninguém liga para liberdade". O argumento sobre como o conceito de liberdade foi "superado" por muitas pessoas é impossível de ignorar e nos leva a pensar que sim, hoje em dia estamos nos importando mais com segurança do que com liberdade. Importa para nós estarmos seguros, ainda que isso signifique abrir mão de muitas liberdades individuais. Por proporcionar este tipo de reflexão, o filme já merece o mínimo de crédito.

Além disso, Justin Kurzel dirige seguindo uma decupagem elegante, lembrando o trabalho realizado anteriormente em Macbeth: Ambição e Guerra (também estrelado por Fassbender e Cotillard); ao mesmo tempo em que tenta dar ao filme um aspecto de vídeo game, no qual a câmera ganha liberdade de eixo e direção. Esteticamente falando, Assassin's Creed ainda consegue ser melhor que muitas adaptações de vídeo games que vimos anteriormente. No entanto, na parte que seria a mais importante do filme, que é a ação, Kurzel desaponta. As lutas são bem coreografadas e as perseguições a pé (que incorporam muitos elementos de parkour) lembram em parte o jogo no qual o filme foi inspirado, mas não apresentam nada de novo ao gênero de ação e não agregam nenhum valor ao longa.

O roteiro escrito a seis mãos por Michael Lesslie, Adam Cooper e Bill Collage termina por entregar uma trama arrastada, sem ritmo, cujos personagens são unidimensionais e desinteressantes. Por mais interessantes que sejam Michael Fassbender, Marion Cotillard, Jeremy Irons, Denis Ménochet e Michael Kenneth Williams, não há bom intérprete que salve personagem mal desenvolvido. Callum Lynch é um protagonista sem propósito algum na história que, do nada, se dedica de corpo e alma para o Credo dos Assassinos, e sua transição de errante para assassino com causa não convence. Dói mais ainda ver atores como Brendan Gleeson e Charlotte Rampling em pontas mal aproveitadas e desperdiçadas.

Contando com o melhor elenco que já habitou uma adaptação de vídeo game, Assassin's Creed não aproveita o potencial de seus intérpretes, de seu diretor, nem de seu material original. É uma adaptação que pode não agradar nem quem joga o game. É mais provável que jogar Assassin's Creed seja uma experiência mais satisfatória do que assistir ao filme. É algo a se experimentar.

Ubisoft 368964518142772338

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