loggado
Carregando...

[Review] True Detective 2x01 - The Western Book of the Dead

Rodovias de lama.


Rodovias de lama.

Quando em sua primeira entrada True Detective trouxe a Louisiana pantanosa de cultos macabros e assassinatos ritualísticos como palco para reflexões verborrágicas, porém hipnotizantes, sobre o lado negro da alma humana, ficou claro que o ambicioso pontapé inicial do showrunner Nic Pizzolatto se somaria facilmente ao hall das produções de ouro na TV americana. Revelando-se como uma aposta grande no gênero das antologias - formato em alta desde o sucesso instantâneo de American Horror Story -, muito se especulou sobre a possibilidade de um segundo ano não fazer jus a temporada de estreia. Uma preocupação genuinamente válida, porém necessária, apenas se o conceito de contar histórias de forma antológica for verdadeiramente compreendido.

True Detective não tinha e ainda não tem obrigação alguma de retomar a estrutura da história de horror não linear protagonizada por Rust Cohle e Martin Hart, e fico feliz em dizer que essa premiere sabiamente se afasta em termos de alma e tom de tudo aquilo que vimos no começo do ano um. Ao bem da verdade, a ausência do diretor Cary Fukunaga tem partes - boas e ruins - neste distanciamento diametral de uma temporada para outra, porém, como eu disse, tomar consciência e utilizar tais mudanças que justifiquem o formato antológico é necessário para reforçar o DNA do próprio show.

Infelizmente, pelo menos à primeira vista, a nova história de Pizzolatto causa uma estranheza desconfortante, justamente por mostrar uma certa fragilidade nos quesitos técnicos, algo incomum para quem, assim como eu, estava acostumado com o preciosismo estético da temporada passada. Por exemplo, num episódio de uma hora de duração, o recurso de tomadas aéreas dos locais onde a trama se passa é utilizado com tanta frequência que chega a ser um banho de água fria assistir o gancho final usar a mesma saída vista anteriormente para imprimir tensão. Confesso de antemão que a única sequência realmente inspirada é o encontro do detetive Ray Velcoro com o empreendedor mafioso Frank Semyon, num bar de pouca luz e jazz depressivo.

A trama bebe da fonte dos noir mais clássicos e traz uma Los Angeles com seus pequenos condados permeados em sombras, mesmo nos dias mais claros. Essa escuridão reflete diretamente no comportamento errático e atormentado dos três protagonistas: Velcoro, a também detetive Ani Bezzerides e o patrulheiro Paul Woodrugh. Todos eles apresentam histórias individuais que se cruzam já no fim do episódio por conta de um misterioso crime, tendo Semyon como cabeça nas suas futuras repercussões. Apesar da trama aparentemente simples - algo haver com empreiteiras de pano de fundo corruptas -, o texto de Pizzolatto nos provoca novamente ao dar pistas pontuais sobre algo maior por debaixo dos panos. O não subestimar o espectador aqui - tirando um desnecessário e expositivo diálogo sobre a origem dos nomes de Ani e da sua irmã -, continua sendo um dos maiores trunfos do roteirista, mesmo que a história assuma somente o aspecto do velho whodunnit mais pra frente.


É sempre gratificante assistir um casting acertado em ação, e True Detective volta a não fazer feio. Com Colin Farrell dando vida ao amargurado e violento Ray Velcoro e Rachel McAdams fazendo da sua Ani Bezzerides, um personagem feminino forte e já cheio de camadas, fica fácil para vocês descobrirem quem dos quatro atores principais se mostrou melhor na estreia, não é mesmo? Velcoro e Ani serão os dois lados de uma mesma moeda, e ver como a história deles vai se entrelaçar daqui para frente será um exercício no mínimo animador. Vince Vaughn e Taylor Kitsch não têm muito material neste começo, mas dos dois acho que Kitsch se saiu bem melhor ao apresentar o quão quebrado o misterioso patrulheiro Paul se encontra. Ainda vai levar um tempo para dizer se Vaughn convence como Semyon, porém, de cara, achei o ator um tanto quanto desconfortável na pele do mafioso e trocaria fácil sua figura pelo Timothy V. Murphy, o eterno Galen O'Shay de Sons of Anarchy.

Carregando um selo que virá com cobranças homéricas nas próximas sete horas, True Detective pode sim ter começado pouco inspirada, mas isto não significa um erro máximo e incorrigível. Pizzolatto possui uma missão e tanto pela frente, e os créditos que o cara tem nos faz dar um merecido voto de confiança. No lamaçal humano das rodovias de L.A. ainda iremos encontrar muitos baques. Alguns mais brutais do que outros, mas não menos provocativos. A expectativa, meus caros, é que se torna nossa inimiga. Cuidado com ela. Muito, mas muito cuidado. 

P.S.1: Abertura linda e ao som do monstro Leonard Cohen. Não preciso dizer mais nada.

P.S.2: Duas rimas inspiradas com a primeira temporada: Velcoro falando com a advogada no mesmo posicionamento que o Rust durante os depoimentos e Ani e seu parceiro num quadro semelhante ao das saudosas viagens de carro, feitas por Rust e Martin. Homenagens bem válidas.

True Detective 8608587423156966285

Postar um comentário Comentários Disqus

Página inicial item