loggado
Carregando...

[Resenha] Jogos Vorazes

Muito mais do que uma nova moda.


Muito mais do que uma nova moda.

Jogos Vorazes evoluiu de fenômeno cult para febre internacional desde o lançamento do filme de mesmo nome, adaptado do livro. Agora, simplesmente, todo mundo adora Jogos Vorazes. Mas essa fama data desde 2008, quando o livro foi um instantâneo sucesso de crítica e público. Com a estreia de Em Chamas se aproximando, resolvemos dar uma olhada no início de tudo.

Este primeiro livro é, sem dúvidas, o mais fraco e chulo da série, e ainda assim consegue ser empolgante e envolvente. A história já é conhecida: Katniss Everdeen, uma garota de dezesseis anos, vive num futuro distante, no Distrito 12 da nação Panem, que representa o que restou da América do Norte após uma série de desastres naturais. Após uma rebelião há 74 anos, que resultou na derrota dos revoltosos, a Capital - símbolo do poder de Panem - assinou um tratado no qual instituía que, todo ano, cada Distrito deveria ceder um garoto e uma garota entre 12 e 18 anos para lutar até a morte no maior evento televiso do país: os Jogos Vorazes. Após sua irmã ser escolhida, Katniss se oferece para lutar na Arena, junto a Peeta Mellark, um garoto com quem tem uma dívida do passado.

Uma das primeiras considerações a ser feita é que Jogos Vorazes é um livro adulto sob uma roupagem adolescente. A premissa, sombria por si só, não transmite a densidade psicológica e o conteúdo da narrativa, que foca pouco em ação, dando destaque às técnicas de sobrevivência de Katniss e à alienação da Capital. A estrutura em si é diferenciada: passamos os primeiros capítulos no Distrito 12, seguindo para o treinamento na Capital, e só chegamos à tão esperada Arena depois da metade do livro. Durante este tempo todo, a autora, Suzanne Collins, demonstra que não está preocupada em fazer grandes batalhas ou cenas de ação, e sim em construir uma crítica à banalização da violência e à alienação televisiva - como vemos na Capital, onde as pessoas torcem e aclamam os concorrentes à despeito do fato de que, se perderem, irão morrer (e, às vezes, há aqueles que torcem pela morte mais cruel possível). Katniss, por exemplo, passa a maior parte do livro armando estratégias para conquistar o público, o que oferece um insight interessante sobre o mundo dos reality shows e foge da mesmice de ação sem parar, ou até mesmo da superficialidade que é comum em livros para o público young adult

Nesse mesmo quesito, Jogos Vorazes oferece twists bem-vindos à literatura jovem, dando maior substância aos personagens e derrubando convenções de protagonistas perfeitos e a clássica divisão entre "bem" e "mal". Katniss está longe de ser a típica mocinha inocente. Não só ela é forte como também é egoísta, e abriria mão de tudo para defender seus interesses - que se resumem à proteção da irmãzinha, Prim. Em certos pontos, fica claro que ela deixaria Peeta morrer sem pensar duas vezes, se assim fosse necessário. Do mesmo modo, há o romance, que é puramente fingido para ganhar a audiência, ou assim Katniss acha. Não é certo dizer que ela não sente remorso (isso já é um assunto para mais tarde), mas, mesmo com consequências desastrosas, ela sobrevive. Magoando Peeta com seu radicalismo, ela faz tudo o que é necessário para sobreviver, o que é ótimo para trazer uma visão um pouco mais crítica e realista, já que esta é a própria proposta da saga. 

Outra questão interessante é a construção de diversos simbolismos não só através do livro em si, mas da saga como um todo. O triângulo amoroso entre Peeta e Gale demonstra a fragilidade emocional de Katniss: enquanto Gale representa essencialmente o que ela é - forte e realista, pronta para enfrentar o mundo cruel e independente -, Peeta representa sua única salvação - mesmo sendo fraco fisicamente e vulnerável à violência, tem uma capacidade única de consolar o psicológico magoado e amedrontado de Katniss. Peeta é uma representação católica da salvação, uma vez que se sacrifica por ela, permanece "morto" por três dias e então ressurge como a única esperança dela voltar para casa - bem como o maior símbolo da revolta que Katniss sente contra a Capital, como se revela na cena final em que os dois ameaçam suicídio. Mas, talvez, a referência mais genial está na construção da mitologia de Panem: cada um dos doze Distritos, mais a Capital, representam o nosso mundo atual e nossas atividades socioeconômicas; os Distritos mais pobres são um reflexo do que é a nossa África (o que fica claro quando é dito que seus habitantes, incluindo Katniss e Rue, são em maioria negros); o Distrito 8 é essencialmente têxtil, numa referência às nações asiáticas exploradas a baixo custo; o Distrito 4 é responsável por artigos marítimos, o que pode ser interpretado numa nova alusão à Ásia ou à América Latina, juntamente aos Distritos agrícolas; e, claro, há a Capital, que representa as nações desenvolvidas, centro do mundo capitalista e responsáveis por intensa exploração, já que todos os produtos dos Distritos são invariavelmente levados à Capital a preços baixíssimos.

Dentre todas as fantásticas alusões - e aí entra também o muito citado mito de Teseus, as arenas dos gladiadores, lendas da Grécia Antiga e até mesmo convenções feministas -, a maior falha do livro está no amadorismo da escrita. É até possível entender que Katniss, no primeiro livro, é apenas uma garota pobre que desistiu da escola e por isso não tem nenhuma sofisticação no linguajar narrativo - coisa que não acontece no segundo livro, quando ela já leva uma vida boa e é mais sofisticada e instruída -, mas, ainda assim, a narração chula é bastante incômoda. Por isso este é o livro mais fraco da saga. Collins ainda estava descobrindo este mundo que havia criado, incluindo a linguagem preguiçosa, e foi dar maior sofisticação às alusões e à narrativa somente em Em Chamas.

Apesar de suas falhas, Jogos Vorazes ainda é um ótimo livro, com a capacidade de empolgar, assustar e emocionar. Foi, sem dúvidas, um choque em 2008 ver uma quebra tão radical à fórmula de livros adolescentes, bem como uma história aparentemente tão previsível (a premissa de um reality show no qual pessoas se matam não é nenhuma novidade) se transformar em uma saga tão rica. É uma leitura bastante interessante - mesmo que os leitores mais exigentes impliquem com a linguagem pobre.

Ainda não está participando da nossa promoção?  Concorra a um Super Kit com a trilogia de livros Jogos Vorazes e muito mais! Saiba mais clicando AQUI.
Resenhas 7124929335893115238

Postar um comentário Comentários Disqus

Página inicial item