[Crítica] Jogos Vorazes: Em Chamas
Quem não apostaria na Garota em Chamas?
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Quem não apostaria na
Garota em Chamas?
Se sequências geralmente são
problemáticas, sequências de adaptações de sucesso são ainda mais perigosas. A
cobrança aumenta por parte do público fiel, a crítica espera por algo tão bom quanto
o original – isto é, se o primeiro for ovacionado – e claro, as mudanças no corpo
produtivo, sempre geram uma certa expectativa, afinal, o que funcionou antes
pode ter sido deixado para trás. Em
Chamas, o segundo capítulo da adaptação da trilogia Jogos Vorazes de Suzanne
Collins, não só se mostra uma surpresa ainda mais agradável que o primeiro
longa, como consegue figurar fácil na lista de blockbusters mais completos do ano. Volta o subtexto político, a
crítica nenhum pouco comedida ao explotation
sacal dos reality shows, o bem
ambientado universo distópico e também o charmoso elenco – acrescido das mais
bem vindas adições, encabeçadas por ninguém menos do que Philip Seymour Hoffman –, porém é na segura direção de Francis Lawrence (Eu Sou a Lenda, Água para Elefantes), substituindo magistralmente o
bom trabalho de Gary Ross, que a obra
de Collins ganha seu lugar definitivo
nas telonas.
Voltando à Panem que agora lida com
as consequências da popular última edição dos Jogos Vorazes, descobrimos que os
ganhadores Katniss Everdeen (Jennifer
Lawrence) e Peeta Mellark (Josh
Hutcherson) devem viver o seu status
de celebridades nacionais, para que a opressora Capital tente conter a
insurgente faísca de revolução plantada pela destemida Katniss. Porém, ao
perceber que os planos do sombrio Presidente Snow (Donald Sutherland) pretendem mostrar que a mão de ferro da Capital
é a única lei existente, a jovem deve lutar não apenas por sua vida, mas por
toda a população de Panem.
Contornando os principais
problemas do roteiro de Gary Ross e Billy Ray, os roteiristas Michael Arndt (Toy Story 3) e Simon Beaufoy
(Quem Quer ser um Milionário?), não
deixam a trama política de Em Chamas
em segundo plano. Desta forma, o cruel universo do filme passa a ser mais real,
ao passo que a história de Panem e dos próprios jogos vai ficando mais clara –
não se esqueçam de que nem todo mundo que vai ver o filme leu os livros – e interessante.
A dupla ainda mantém os paralelos que Collins
faz a Roma antiga (como na cena do baile envolvendo um estômago cheio) e o mordaz
ataque à alienação da sociedade diante da prática do “Pão e Circo”. É também
muito corajoso o fato dos roteiristas optarem novamente por mostrarem os tão
esperados jogos apenas na hora final do filme, que consegue imprimir nos seus
dois primeiros atos um ritmo bem mais dinâmico graças à edição de Alan Edward Bell.
Se o incômodo causado pela “câmera
tremida” e os cortes secos de Gary Ross
eram os principais deméritos do primeiro Jogos
Vorazes, a contida, porém enxuta, direção de Francis Lawrence engrandece e dubiamente valoriza todo o tom épico
da história. Planos mais abertos e um design
de produção enriquecido graças ao orçamento dobrado, tornam Panem, seus
distritos e a megalomaníaca arena num deleite visual, que é captado com
precisão pelas câmeras do diretor. A fotografia de Jo Willems e o trabalho deslumbrante da figurinista Trish Summerville não denotam menos do
que um esforço conjunto de toda a produção do filme em dar vida ao universo de
Em Chamas. Notem que a triste Aldeia
dos Vitoriosos e o nevado Distrito 12 parecem sugar todas as cores e alegria
do local, tornando até mesmo uma ampla floresta de pinheiros num ambiente
claustrofóbico, enquanto a Capital e tudo que a envolva explode em cores, seja
nos luminescentes hologramas da sala de treinamento, seja nos perigosos
bestantes da arena.
Com Jennifer Lawrence retornando à sua Katniss construída sob as nuances
de uma adolescente pragmática o suficiente para colocar a sobrevivência de quem
lhe importa na frente de qualquer outro, abrimos um elenco estelar. Josh Hutcherson (mais à vontade dessa
vez) é o Peeta altruísta, apaixonado, porém bem mais político do que sua
parceira, e cresce em tela toda vez que divide cenas com Lawrence. Woody Harrelson
e Elizabeth Banks ainda são
responsáveis por amenizar o tom soturno do longa, mas há duas cenas em
particular envolvendo Haymitch e Effie, que são de partir o coração. Donald Sutherland é o déspota frio e calculista,
que desta vez ganha um merecido destaque dividindo a cadeira com Philip Seymour Hoffman, o novo e
enigmático idealizador dos jogos, Plutarch Heavensbee. Dos novatos, quem se
destaca de verdade é Sam Claflin,
como o sedutor Finnick Odair, e Jena
Malone, como Johanna Mason, uma contraparte desafiadora para Katniss e sua
alcunha de garota-problema. Vale dizer, também, que a agora não mais improvável
presença de Lenny Kravitz trás para
o estilista Cinna um tom paternal crucial para uma das sequências mais
impactantes da trama. É também sempre bom ver o cartunesco Caesar Flickerman ser defendido tão bem por Stanley Tucci.
Agora, porém, - não que seja um problema maior - o fio mais frágil do elenco
inteiro ainda é o inexpressivo Liam
Hemsworth que, para ser sincero, é “tanto faz, como tanto fez”, igual ao
próprio Gale.
Encurtando as firulas do material
de origem e sem se amarrar ao que se espera de um filme destinado ao público
infanto-juvenil, Em Chamas vai
crescendo cada vez que questiona, cutuca e escancara os horrores de uma
sociedade aparentemente tão distante, mas que se faz nossa nas piores situações
vistas durante a projeção. É triste constatar isto? Sim. Porém é animador ver
um material tão rico e forte ganhando espaço entre os jovens da era midiática.
Só fica uma dúvida: será que pelos motivos certos?