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Falando Sobre... | The Get Down - Parte 1


Shaolin’s the DJ that we call conductor,
cause Shaolin Fantastic’s a bad motherf...” 

Dono de uma estética única e peculiar, Baz Luhrmann é um cineasta “oito ou oitenta”. Sua obra, dotada de um estilo extravagante e povoada por personagens singulares, faz com que Luhrmann se encontre na categoria de cineastas que ou você ama ou você odeia. O diretor de Romeu + Julieta, Moulin Rouge: Amor em Vermelho, Austrália e O Grande Gatsby dá um dos passos mais ambiciosos de sua carreira com a série The Get Down, exibida pela Netflix.

Em The Get Down, somos apresentados a um mosaico formado por personagens interessantíssimos que habitam o bairro nova-iorquino do Bronx, predominantemente negro e porto-riquenho. O centro, inquestionavelmente, é o casal Zeke (Justice Smith) e Mylene (Herizen F. Guardiola). Zeke é um rapaz negro de descendência porto-riquenha com um dom natural para a poesia. Já Mylene é uma moça que nutre o sonho de sair do Bronx para se tornar uma cantora profissional e famosa. Ela é filha de Lydia (Zabryna Guevara) e Ramon (Giancarlo “Gus Fring” Esposito), um rígido pastor neopentecostal. Muitos são os obstáculos que se colocam entre os dois.

Zeke parece não ter muita direção em sua vida, o que preocupa muito seus tios e a Sra. Green, sua professora de inglês. Andando com os amigos Ra-Ra (Skylan Brooks), Boo-Boo (T.J. Brown Jr.) e Dizzie (Jaden Smith), Zeke acaba tendo seu caminho cruzado com o de Shaolin Fantastic (Shameik Moore), um pequeno traficante do bairro que sonha em ser DJ. Em busca de orientação, Shaolin vive à sombra do Grandmaster Flash (Mamoudou Athie), DJ do The Get Down, uma das festas mais badaladas do Bronx.

Imagem: Myles Aronowitz/Netflix

Entre idas e vindas, Shaolin faz alguns pequenos serviços para Fat Annie (Lillias White), dona de uma boate chamada Les Inferno que tem um filho conhecido como Cadillac (Yahya Abdul-Mateen II), que não vê a proximidade entre sua mãe e Shaolin com bons olhos. Ao descobrir o dom de Zeke com as rimas e as palavras, Shaolin faz de tudo para cooptar o jovem para ser seu MC, mas acha que Mylene é uma distração para Zeke e é responsável por boa parte dos conflitos do casal, propositalmente.

Por outro lado, Mylene está muito determinada a se tornar uma cantora. Determinada a ponto de colocar sua relação com Zeke em segundo plano e desafiar a rigidez e o conservadorismo de seus pais. Para realizar tal feito, a moça conta com a ajuda de Papa Fuerte (Jimmy Smits), irmão de seu pai que vem a ser um homem muito influente no Bronx. Disposto a fazer de tudo para transformar sua amada sobrinha em uma estrela, Papa Fuerte entrega Mylene aos cuidados do produtor musical Jackie Moreno (Kevin Corrigan), que percebe potencial na moça e deseja fazer uma composição especialmente para a voz dela, cooptando também as amigas desta como backing vocals, Yolanda (Stefanée Martin) e Regina (Shyrley Rodriguez). Há ainda diversas subtramas como a troca de favores entre Papa Fuerte com Ed Koch (Frank Wood), candidato a prefeito de Nova York, e o envolvimento de Lydia com seu cunhado.

Baz Luhrmann
Criada por Luhrmann em parceria com Stephen Adly Guirgis, The Get Down adota uma estrutura curiosa ao dividir sua primeira temporada em duas partes (a segunda parte só estreia em meados de 2017). A série toma a corajosa iniciativa de investir bastante tempo desenvolvendo quase todos os personagens. Uma estratégia que se revela uma faca de dois gumes: se, por um lado, é admirável que os criadores se preocupem em fornecer substância e complexidade aos seus personagens, por outro lado, esta decisão criativa deixa a trama dispersa, o que acaba imprimindo um ritmo lento à história e impedindo que o espectador seja fisgado em um primeiro momento.

Não obstante, Luhrmann também escorrega ao conceber o piloto no formato de longa-metragem (aproximadamente 93 minutos), tornando o episódio um espetáculo ocasionalmente maçante. O que poderia ser contornado se o diretor respeitasse o formato padrão de episódio de até uma hora, amplamente utilizado por séries televisivas dramáticas. Contudo, uma estratégia narrativa interessante utilizada pela série é inserir a versão adulta de Zeke como um narrador, que relaciona os acontecimentos do episódio anterior com o que está para acontecer, e como os personagens se encaixam na história que será contada. Quando adulto, Zeke é Mr. Books (Nas), um famoso rapper nos anos 1990 que se utiliza das rimas declamadas no palco para situar o panorama geral do episódio, remetendo às peças shakespearianas e aos coros das tragédias gregas.

No tocante às atuações, o casal protagonista Justice Smith e Herizen F. Guardiola esbanja talento tanto nas cenas dramáticas quanto nas sequências em que precisam exibir seus talentos para a performance musical. Jaden Smith desperta admiração pela humildade de sair dos holofotes (e da sombra de seu pai) e pela dedicação em criar um personagem interessante, que promete surpreender ainda mais na continuação desta temporada e nas temporadas que estão por vir. Shameik Moore rouba a cena sempre que aparece como Shaolin Fantastic, uma figura capaz de instigar o imaginário de Zeke e de seus amigos, ao mesmo tempo em que diminui quando está diante de Grandmaster, Fat Annie e Cadillac.

Apesar de não causar o mesmo barulho e frisson causados por Stranger Things, por exemplo, The Get Down é uma série que impressiona pelo tamanho de sua produção e que conta com personagens dignos de nossa torcida. Agora que foram feitas as devidas apresentações, é esperado que a série encontre seu ritmo e conquiste cada vez mais fãs.

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