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[Crítica] Grandes Olhos


Outrora, talvez a bizarrice de Tim Burton fosse sempre bem-vinda. O cineasta soube como poucos deixar uma marca e um estilo próprios e bem sucedidos, criando grandes clássicos, ou, pelo menos, filmes muito divertidos. O problema é que nos últimos anos Burton parece ter desaprendido o que fazia sua estranheza ser tão interessante – e o resultado de tais esforços são obras como Grandes Olhos, um filme irregular e com pouca graça.

Grandes Olhos se aventura no campo das cinebiografias – a última realização do diretor no gênero foi em 1994 com Ed Wood –, propondo-se a contar a história de Margaret Keane (Amy Adams), uma artista que, ao separar-se do marido, casa-se com Walter Keane (Christoph Waltz), outro artista. As pinturas de Margaret são um sucesso altamente rentável, mas ela não ganha nenhum crédito por isso: Walter clama ser o verdadeiro autor, obrigando-a a continuar produzindo e causando uma crise que leva o caso aos tribunais.

O maior problema de Grandes Olhos é a falta de equilíbrio e seu tom inconstante. Nem o roteiro de Scott Alexander e Larry Karaszewski, nem a direção de Burton contribuem para organizar as aspirações dramáticas e cômicas da premissa, atropelando ambas e impedindo o filme de ser realmente engraçado ou envolvente. A história se desenrola sem energia e apática, quase no piloto automático, parecendo aterrorizada em ousar, ainda que minimamente. Burton na direção não conta com o mínimo de personalidade, tornando o resultado final dolorosamente ordinário e sem impacto. A trilha sonora de Danny Elfman não serve de amparo, sendo por sua vez também comum e utilizada em momentos ruins, atrapalhando o desenvolvimento emocional de muitas cenas. Não se pode dizer, entretanto, que o filme não é um pouco divertido. Mesmo que não arranque gargalhadas, Grandes Olhos raramente decai ao tédio absoluto, de forma que serve como passatempo. Seu comentário sobre o machismo nos anos 1950, apesar de inocente em sua conclusão, também rende bons momentos – a cena do confessionário é provavelmente uma das mais fortes e mais bem sucedidas de todo o filme.

O ápice da dicotomia não-intencional entre drama e comédia em Grandes Olhos – que pode ser encarada também como a dicotomia entre uma proposta mais comum e a estranheza típica de Burton – está em seus protagonistas, Margaret e Walter Keane. Enquanto a personagem de Amy Adams (que entrega uma performance intensa e nem um pouco caricatural dos maneirismos dos anos 1950) é reservada força dramática da história, Christoph Waltz ganha um personagem exagerado, completamente over e infantil (sem dúvidas, uma instrução vinda do próprio Tim Burton), e fica responsável pela maior parte da bizarrice “burtoniana” do filme. Walter Keane parece ter saído de um desenho animado ou de uma comédia slapstick, de forma que sua personalidade caricatural engole tudo em todas as cenas, como um buraco negro – o que não seria tão ruim e poderia até ser engraçado se não fosse a falta de inspiração por parte especialmente da direção, que falha em garantir ao personagem a mesma comicidade exagerada vista em Bettlejuice ou em Edward Mãos de Tesoura. Assim sendo, na maior parte do tempo, Walter é simplesmente irritante e deslocado, enquanto Margaret, uma personagem indubitavelmente dramática, sofre com um desenvolvimento fraco e com a relegação ao segundo plano em muitas cenas, estando para Will Turner assim como Walter está para Jack Sparrow. Não nego que esta talvez tenha sido uma exigência da construção de uma atmosfera cartoonish – mas se ao menos esta tivesse sido bem sucedida!

Mesmo com belíssimas fotografia e direção de arte, que tornam o filme numa experiência visual (apesar que esta não seja tão interessante como a dos filmes anteriores do diretor), Grandes Olhos não consegue superar a superficialidade, pecando pela extrema falta de senso dramático. Divertido, sim, mas dispensável e sem metade da força dramática ou cômica vista nos trabalhos anteriores de Tim Burton.

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