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[Crítica] Creed: Nascido Para Lutar


No ano em que ganhou o Oscar de Melhor Filme, em 1977, Rocky: Um Lutador já era um estrondoso sucesso frente a outros clássicos do cinema lançados na mesma época, como Taxi Driver, Rede de Intrigas e Todos os Homens do Presidente. Além disso, o filme foi responsável por alavancar a carreira de seu protagonista e roteirista: Sylvester Stallone. Começava ali uma franquia memorável. Quatro décadas depois, chega aos cinemas Creed: Nascido Para Matar, um filme que inicia uma nova história a partir do legado já consagrado.

Fruto de um caso extraconjugal, Adonis “Donnie” Johnson (Michael B. Jordan) era o típico garoto problema que mudava de reformatório em reformatório devido às confusões em que se metia. Em um destes reformatórios, Adonis é encontrado por Mary Anne (Phylicia Rashad), viúva de Apollo Creed, seu pai biológico. Os anos passam e o jovem cresce num ambiente abastado, com um bom emprego em uma firma de seguros e levando uma vida dupla como boxeador do outro lado da fronteira dos EUA com o México. Ao ver que o boxe estava falando mais alto em sua vida, Adonis larga o emprego e o conforto de Los Angeles e muda-se para a Filadélfia, onde tentará obter ensinamentos com o maior oponente de seu pai: Rocky Balboa (Sylvester Stallone).

O filme se sai muito bem na tarefa de assumir como um produto desvinculado da série Rocky. Créditos ao diretor Ryan Coogler (que co-escreveu o roteiro com Aaron Covington). Revelado como cineasta no ótimo Fruitvale Station - A Última Parada, seu maior mérito foi trazer seu próprio estilo ao construir uma nova obra. Com a ajuda da diretora de fotografia Maryse Alberti (que tem experiência em filmes do gênero como O Lutador, de Darren Aronofsky), Coogler cria sequências de luta ambiciosas ao rodar em plano-sequência a primeira luta de exibição de Adonis e dando um toque intimista no embate final ao filmar os oponentes envoltos pela escuridão, enquanto apenas os dois estão iluminados. A trilha sonora de Ludwig Göransson evoca os acordes clássicos de Bill Conti, dando energia às sequências de luta e de treino e auxiliando ao conferir o tom nas cenas mais dramáticas.  

Mas, acima de tudo, Creed: Nascido Para Lutar é um filme sobre a construção de um legado próprio. Isto se reflete na forma como o filme foi produzido; na própria jornada de Adonis, que tenta edificar uma carreira sem ser constantemente associado ao nome de seu pai; e até mesmo nas ambições de Ricky Conlan, o principal oponente do personagem-título, que se mostra preocupado com sua própria história ao entender as motivações financeiras de seu empresário quanto a uma possível luta contra Adonis (“não é assim que quero ser lembrado”, desabafa Ricky). Apesar de o cânone ser constantemente citado em Creed: Nascido Para Lutar (linhas de diálogo, a sequência de treino com a galinha, os figurinos), ele surge aqui como uma forma de reverenciar o legado construído pela série. Reverência que se mostra literal na cena em que Adonis, após correr acompanhado por motociclistas, vibra junto com Rocky Balboa, que observa seu pupilo de uma janela do alto do ginásio.


Assumindo o papel-título, bem como trabalhando com seu diretor de Fruitvale Station - A Última Parada pela segunda vez, o ator Michael B. Jordan preenche a tela com sua marcante presença de cena, convencendo-nos de que, apesar de criado na casa de Mary Anne, ainda existe resquícios do garoto-problema que foi um dia. Ressentido pelo fato de não ter tido a oportunidade de conhecer o pai, Adonis se dedica de corpo e alma ao boxe como se quisesse ter a chance de se conectar com Apollo, tanto que o jovem não hesita em adotar Rocky como uma figura paterna (embora chame o Garanhão Italiano frequentemente de “tio”). Prestem atenção na cena em que, antes de entrar no ringue para sua primeira luta de exibição, o árbitro dita as regras para Adonis dentro do vestiário. A reação do ator é genuína, pois, apesar de representar um momento de tensão, a resposta de Jordan às instruções do juiz nos leva a uma ocasional risada (vocês reconhecerão a cena).

Tessa Thompson surge como a revelação do filme no papel da cantora Bianca, funcionando mais do que um simples interesse romântico de Adonis, que tem suas próprias aspirações e é uma figura trágica a seu modo. Phylicia Rashad e Tony Bellew aproveitam o pouco tempo de tela para defenderem seus personagens. Enquanto a primeira transmite para o espectador a preocupação que tem em Adonis terminar da mesma forma que Apollo, o segundo é hábil ao estabelecer “Pretty” Ricky Conlan como um oponente forte, jamais um antagonista (ainda que às vezes pareça ser).

E por último, porém não menos importante, precisamos falar sobre Sylvester Stallone. Ícone absoluto do cinema mundial, o ator de 69 anos volta a interpretar, pela sétima vez, o personagem que o tornou famoso e que abriu as portas para uma carreira singular. Os gestos, a postura, o modo de andar e falar do Garanhão Italiano são realizados à perfeição por Stallone, como se ele jamais tivesse deixado o personagem para trás. No entanto, o ator confere ao personagem uma faceta de extrema fragilidade através de uma performance tocante e sensível, como jamais vimos em seus filmes anteriores. Rocky está completamente sozinho, sem Adrian, sem Paulie e com o filho morando no exterior, sugerindo que os desentendimentos deste com seu pai não acabaram. Ao contrário de Adonis, que está descobrindo sua própria voz, Rocky se sente esgotado e sem vontade de lutar em sua vida. Porém, recebe novo fôlego ao conhecer o jovem, ganhando motivação para ajudar o rapaz a construir uma carreira no mundo do boxe, ao mesmo tempo em que precisa lutar um dos combates mais importantes de sua vida. Não se surpreendam se caso Stallone vir a ser indicado a um certo prêmio e ganhar.

Demonstrando total respeito aos filmes que o antecederam, Creed: Nascido Para Lutar é bem sucedido ao se diferenciar do cânone, apresentando um protagonista digno da nossa torcida sob a batuta de um dos maiores personagens da história do cinema. O filme representa um momento de glória na carreira de Sylvester Stallone, um passo promissor na carreira de Michael B. Jordan e a constatação de que Ryan Coogler é um talento a ser acompanhado bem de perto.

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