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[Resenha] Tripulação de Esqueletos


Para os fãs de Stephen King, Tripulação de Esqueletos pode não ser o melhor dos livros do mestre, mas certamente é obrigatório. Reunindo os contos do início da carreira de King – alguns muito conhecidos e divulgados, outros nem tanto –, Tripulação de Esqueletos demonstra que, mesmo inexperiente e suscetível a erros, já desde o princípio King sabia como evocar as mais diversas sensações em seus leitores.

Contando com pouco mais que vinte contos, Tripulação de Esqueletos é um livro que pode ser lido em qualquer ordem; mesmo com o passar dos anos (o conto mais antigo data de 1968 e o mais recente, de 1985), King não demonstra um padrão de interesses, escrevendo sobre diferentes temas de diferentes formas. Portanto, é difícil analisar uma possível evolução, já que esta fase de sua carreira foi marcada pela experimentação – coisa que pode ser vista em alguns de seus livros da época, que não diferem de forma gritante um para com o outro.

A intenção aqui, portanto, não é fazer um exercício nostálgico sobre os primórdios de um grande mestre – apesar de o livro certamente propiciar alguns momentos do tipo. Prefiro focar puramente na habilidade de King de criar grandes histórias. Claro, nem todos os contos mantêm o mesmo nível de excelência – alguns se exageram em clichês, outros sofrem problemas de foco ou ainda com o fato de serem excessivamente longos, portanto monótonos –, mas todos são imensamente prazerosos de serem lidos.

O clima de “filme b”, ressaltado pelo próprio King em notas na introdução e no final do livro, é quase constante. Esse mesmo clima acaba sufocando suas histórias, tornando-as realizações menores, como em A excursão – talvez sua primeira tentativa no âmbito da ficção científica –, A balsa – um olhar nostálgico, porém terrivelmente monótono sobre o gênero slasher –, e O macaco – que, talvez, em sua época, tenha sido assustador, mas, hoje, a imagem de um macaco de brinquedo tocando seus címbalos amaldiçoados já se tornou infame. Em outros contos, porém, esse mesmo clima sujo e sombrio só faz adicionar à atmosfera intensamente psicológica típica de King, já prevendo futuros passos do autor. Exemplos são O nevoeiro – que sofre com uma narração fraca, mas encontra força em sua história e no constante clima de tensão –, Aqui há tigres – um brevíssimo conto, deliciosamente surreal –, e Caim rebelado – que repete a temática já explorada no polêmico Rage.

Propositalmente, deixei de fora alguns contos, a maioria favoritos, que gostaria de explorar individualmente. O atalho da Sra. Todd e O processador de palavras dos deuses são dois dos contos mais fascinantes do livro inteiro, mesclando a ótima narrativa que apenas King sabe fazer com tramas criativas e surpreendentes; é incrível que estas histórias tenham permanecido ignoradas dentre as obras do mestre – a segunda, particularmente, é um delicioso exercício moral. O homem que não apertava mãos, Sobrevivente, Vovó e O caminhão do tio Otto são bons exemplos do terror psicológico que King explora durante a maior parte de sua carreira, e por isso merecem também destaque, sendo os dois últimos simplesmente impecáveis. Já O Braço do Mar – conto final do livro – se sobrepõe por fugir da temática do terror e se aproximar muito mais a um drama existencial que, apesar de bastante superficial e ocasionalmente sentimental, oferece uma belíssima reflexão sobre morte e velhice. Outros contos, como A imagem do ceifeiro, Nona, O leiteiro (nº 1 e 2) e Um mundo de praia não são aqui mencionados por serem extremamente inofensivos – alguns até monótonos – e por representarem o elo fraco do livro.

Tripulação de Esqueletos não é perfeito e mostra um Stephen King vulnerável a erros de amadores e muito provavelmente também aos prazos minúsculos com que trabalhava para sustentar sua família no início de sua carreira. Entretanto, alguns contos são verdadeiras pérolas na carreira do Rei, e, como um todo, o livro merece ser conferido apenas para se notar a versatilidade com que o mestre trabalhava, característica esta que carrega até hoje, em sua fase mais sofisticada.

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