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[Crítica] Os Instrumentos Mortais: Cidade dos Ossos

Escapa com louvor de ser tachado como o "novo Crepúsculo ", mas tem lá seus erros.


Escapa com louvor de ser tachado como o "novo Crepúsculo", mas tem lá seus erros.

Para começar, quero deixar claro que sou um fã da saga Os Instrumentos Mortais. Vi o filme sob duas óticas: a de um fã dos livros e a de um espectador de cinema. Tentei ao máximo não deixar um lado atrapalhar o outro, mas é impossível deixar de fazer algumas comparações.

Sem dúvidas, este é um filme que vai gerar bastante discussão. O enredo conta a história de Clary Fray, uma garota aparentemente normal, que, após o sequestro de sua mãe, descobre a existência de um mundo de monstros, vampiros, demônios, entre outras criaturas. Não é a premissa mais genial de todos os tempos, mas a força do filme está na execução.

Como disse acima, Cidade dos Ossos foge completamente de qualquer comparação com Crepúsculo, assumindo-se inteiramente como um filme de ação. E, de fato, que ação. Há diversas sequências de batalhas desde os primeiros quinze minutos, e todas são belíssimas e bem orquestradas. Não há uma que deixe de ser empolgante. 

O problema é que o resto, ao menos de início, não consegue acompanhar. A história em si não é tão genérica quanto se pode imaginar, não. Apesar de haver, sim, alguns clichês, estes não ficam no caminho, de modo comparável a Guerra Mundial Z, outro filme que não foi exatamente uma novidade para o gênero, mas que mesmo assim não deixou de entreter. De fato, a estética visual do filme é um dos pontos mais fortes, o que o torna bem agradável de se ver. Mas, quando digo "o resto", me refiro especialmente aos trinta primeiros minutos do filme, que, tirando as sequências de ação, são uma bagunça só. Faltou organização, lógica e muitas vezes coesão. Eu ponho a culpa no excesso de explicações, pois foi necessário parar para introduzir a mitologia da saga e os personagens, o que afetou um pouco o desenvolvimento deste primeiro ato, que acabou corrido. A mitologia, entretanto, é bastante simples e fácil de entender para aqueles que não estão familiarizados com o livro - simples até demais, pois a adaptação acaba enxaguando vários detalhes sobre os monstros, as criaturas e a magia dos livros, que têm um dos universos expandidos mais densos e completos da atualidade.

Porém, a partir daí, o filme se recupera e passa a se desenvolver de maneira agradável, muito acima da média. A palavra-chave é "organização", que fez tanta falta no primeiro ato, mas no resto se excedeu. Foi um espetáculo de se ver, conseguindo equilibrar o drama, a ação e até mesmo o romance - apesar de haver somente duas cenas que podemos chamar de românticas nesse segundo ato, e nenhuma das duas termina exatamente bem. Certas cenas merecem destaque, como, por exemplo, os momentos na Cidade dos Ossos (que dá título ao filme) e no Hotel Dumort, onde ocorre uma batalha intensa e bem formulada - na minha opinião, a melhor do filme. Os personagens secundários - Isabelle, Magnus e Alec -, que ficaram apagadinhos no início, também ganham maior destaque aqui, apesar de ainda não ser o perfeito. Mas tudo bem, pois, afinal, estes personagens só ganham um bom destaque mesmo no segundo livro; aqui, em Cidade dos Ossos, basta reconhecê-los como assumidamente secundários.

O problema é que, após esse surto de qualidade, que faz o filme ganhar muitos pontos, há um declínio - mais especificamente, nos vinte minutos finais, em relação ao clímax, que volta a ser bagunçado. A ação, apesar de interessante, fica aleatória, além de os momentos em confronto com o vilão principal serem tomados por diálogos longos e desinteressantes. O maior problema é que várias mudanças são feitas em relação ao livro, e, apesar de o público geral ficar entretido, provavelmente os espectadores mais exigentes e os fãs do livro irão se incomodar com a falta de sentido de alguns acontecimentos (e diálogos), e também com algumas mudanças que irão afetar os próximos dois filmes - inclusive, um mistério que só é revelado no final do terceiro livro acaba sendo entregado de cara aqui. O final do filme consegue segurar as pontas, tanto para os fãs quanto para o espectador casual, mas não pode ser chamado de satisfatório. De fato, acaba bagunçado, apressado, subdesenvolvido e até mesmo piegas - uma coisa que o filme inteiro se esforçou para não ser. Peca também pela introdução de elementos do segundo livro, o que deixa ganchos desnecessários e acaba fazendo feio.

Alguns podem achar o resultado final um pouco derivado de outras sagas, HQs e filmes - como Harry Potter, O Senhor dos Anéis, X-Men, entre outros -, mas isso, novamente, é devido a um erro de adaptação. Uma das coisas que fez o livro ser uma novidade tão grande é que, apesar de seus clichês, a história carregava um senso de humor e de alegria extasiante. Ao fazer inúmeras autocríticas, e várias citações e referências à cultura nerd, que variam de Star Wars, Star Trek, animes, mangás, HQs, entre outros, o livro conseguia se manter leve e descontraído. O filme, porém, ao investir num clima sério e gótico, tira um pouco da diversão. Há, sim, momentos engraçados, que deixam claro que o filme não está se levando a sério demais, mas o clima nerd fez falta, principalmente por que podia apelar para essa vertente da cultura popular, e, assim, fazer mais sucesso do que provavelmente fará.

Já em relação às atuações, podemos comemorar o fato de que todas conseguem se segurar. Lily Collins surpreende como Clary numa das performances mais fortes do filme e definitivamente melhor do que toda sua carreira junta, quando muitas das expectativas se dirigiam a Jamie Campbell Bower, no papel de Jace, um favorito dos fãs. Bower faz um bom trabalho, conseguindo transmitir o sarcasmo e a dor do personagem, mas acaba decepcionando um pouco ao não mostrar seu potencial dramático. Robert Sheehan, que encarna Simon, também está ótimo, conseguindo com louvor ser o nerd atrapalhado. Em relação ao elenco secundário, Jemima West, apesar do pouco destaque, fez uma perfeita Isabelle para os fãs do livro, e, para os não familiarizados com tal material, consegue igualmente entreter. Já Kevin Zegers faz um Alec mal-humorado como deve ser, e Godfrey Gao não se excede como Magnus, mas demonstra bastante material para ser aproveitado nos próximos filmes. Jonathan Rhys Meyers, juntamente com Collins, se destaca, construindo um ótimo Valentine, psicótico e violento.

Existem, sim, alguns erros em Cidade dos Ossos que provavelmente irão incomodar e muito. Suas imperfeições são culpa de uma direção e um roteiro fracos, o que eu espero que mude para Cidade das Cinzas, o próximo da saga. Mas, independente disso, é um filme agradável e divertido. Imperfeito, com bastante espaço para melhorias e sem aproveitar completamente seu potencial, Cidade dos Ossos é um filme bom, acima da média, que poderia ser melhor. No geral, o filme fica no saldo positivo. Os espectadores mais exigentes terão alguns problemas, mas o resultado final irá agradar os fãs do livro, aos fãs do gênero e ao espectador casual. E, assim, Os Instrumentos Mortais se estabelece como uma saga com bastante potencial ainda a ser explorado - só esperamos que esse potencial seja devidamente aproveitado no futuro.

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