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[Crítica] Turbo


Entrando em cartaz nos cinemas brasileiros no próximo dia 19, a verdade é que Turbo - apesar de uma campanha considerável de marketing, inclusive ganhando pré-estreias no Brasil - não chega com o alarde de um Universidade Monstros - justamente por não ser da Pixar ou a continuação de um grande sucesso - ou de um Meu Malvado Favorito 2 - pelo segundo motivo citado no primeiro exemplo, ainda que este também seja da Dreamworks -, mas ainda assim surpreende por sua qualidade.

A premissa de Turbo surge com simplicidade, na qual Theo é um caracol que vive no jardim junto com sua comunidade, uma vida pacata e comum para a espécie, trabalhando para encontrar alimentos numa rotina em que os maiores desafios são não deixar que um garoto da vizinhança que persegue insetos os veja ou não serem pegos pelo cortador de grama. Mas o protagonista almeja coisas muito maiores do que seus companheiros de jardim: ele busca desafios e objetivos mais altos, busca a velocidade que não lhe atribuíram naturalmente. Quando se encontra ainda mais frustrado pelos conselhos do cautelosamente realista amigo Chet, Theo decide dar uma volta pelas estradas e observar uma realidade que não poderia mais alcançar, até que seus sonhos voltam a transitar em sua mente quando algo inimaginável acontece: quando o caracol é sugado pelo motor de um veículo, uma transformação genética ocorre e o pequeno animal agora ganha as características do carro; em especial, sua tão desejada velocidade.

Talvez um dos aspectos mais interessantes do roteiro dos pouco experientes Darren Lemke, Robert D.Siegel e David Soren seja inserir novos conflitos para moldar a trama e trazer uma reviravolta a esta, mas sem torná-los forçados para sua continuidade. O exemplo claro é que, seguindo do momento que descrevi no parágrafo acima deste, o conflito inserido é que, quando volta para o seu jardim, Theo - agora já veloz - causa uma confusão no local. Em decorrência de suas novas características, prejudica os outros caracóis e demonstra que, apesar de aos nossos olhos os novos poderes do animal o terem evoluído, dentro de sua própria espécie estes representavam algo de benéfico, afinal de contas, o costume da vida mais tranquila e de ser, de certa forma, uma espécie inferiorizada, já estava instaurado em seus costumes. Mas o que realmente mudará a vida de Theo - além das modificações físicas já ocorridas - será o dia em que, junto de seu companheiro Chet, o caracol sofre a captura por Tito, o dono de um restaurante mexicano que, às primeiras impressões, surge como o vilão da trama. Mas logo descobrimos que o carismático jovem não está os capturando para retirá-los a vida, mas sim para uma "corrida de caracóis". Logo, conclui-se que Tito conhecerá os poderes de Theo e finalmente o caracol terá alguém para depositar esperanças em seus sonhos e, com sorte, tornar-se um corredor profissional.

Antes da abordagem mais aprofundada dos méritos e deméritos do longa, deixe-me abrir um adendo discutindo algo que não costumo, pois não faz parte dos méritos da obra original. Ainda assim, deixo a observação de que, apesar de apostar em dois atores - e não dubladores - entre sua equipe de dublagem, estes não chegam a atrapalhar o competente trabalho de vozes do filme, e o motivo desta observação é que certamente encontrar sessões de Turbo em seu idioma original não será tarefa das mais fáceis, ainda que devesse ser.

A identificação proporcionada por Theo e Tito - tanto entre si, quanto com o público - é imediata, afinal de contas, ambos são grandes sonhadores, não importam quais sejam as dificuldades. E como em certo momento citado pelo ser humano - perdão se cometer algum erro de transcrição do diálogo -, "com minha inteligência e sua velocidade, poderemos realizar nossos sonhos!", e quem não se identifica e simpatiza por sonhadores espontâneos? Mas, claramente, não bastava apenas a motivação dos personagens para que se proporcionasse esta identificação, mas o modo como toda a construção de Theo é feita desde o início, quando sua paixão pelo sonho do automobilismo é quase como a de toda criança que vibra com uma corrida; Tito surge como um rapaz simples e extremamente carismático desde a primeira cena em que troca o olhar com o caracol e observa as capacidades do pequeno animal. Está certo que, em termos de personagens, Turbo tenha alguns problemas contidos, como as próprias caricaturas que são feitas do "time de corrida" que recebe nosso protagonista ou o piloto Guy Gagné, que talvez seja o principal problema do roteiro do longa. E cito isto pelo fato de que, após inserir muito bem todos os conflitos apresentados durante a jornada, o trio de roteiristas falha no desnecessário surgimento do vilão já no terceiro ato, afinal, já bastavam todos os desafios que Theo tinha pela frente simplesmente por ser um caracol lutando por seus sonhos ao disputar uma corrida em Indianápolis, mas talvez pela necessidade da figura personificada da vilania - especialmente com as crianças - levando ao surgimento do irritante piloto.

Mas convenhamos, esta artificialidade não prejudica a jornada de Turbo, que notavelmente resiste à inserir gags cômicas imaturas - inclusive, surpreende por não ter tantas cenas cômicas quanto grande parte das animações que presenciamos no Cinema recente -, algum personagem apenas para fazer graça (talvez este fosse o Sombra Branca, mas no pouco que aparece, sempre é pontual e divertido) ou - pasmem - as excessivas piadas que poderia fazer com aquela típica brincadeira da velocidade dos caracóis no plano fechado e no plano aberto, o que demonstra uma bem-vinda maturidade do texto. Quanto à direção de David Soren - estreando na função em longas-metragens -, seu principal mérito é saber utilizar tão bem a terceira dimensão, que se destaca por sua fantástica imersão e profundidade em diversas cenas, mas especialmente naquela - logo no início - que transpõe as dificuldades do caracol ao estabelecer sua dificuldade para descer uma calçada, já que somente graças à profundidade do 3D, a incitação desta como uma grande barreira funciona - e ainda haverão aqueles divertidos momentos em que os objetos cenográficos da animação "voam" no espectador, e certamente funcionarão com crianças. A trilha sonora também funciona muito bem, assim como a qualidade técnica do filme, que representa muito bem seus espaços cheios de tonalidades e - em planos mais abertos - chegamos a nos ver pensando se estes são reais, especialmente no terceiro ato, filmando a corrida final.

Seja refletindo sobre a superação, a importância dos sonhos ou a simples jornada dos divertidos personagens que nos foram apresentados, a conclusão ao fim da projeção é a de que, apesar de sabermos que num longa como este mesmo os sonhos menos palpáveis podem ser alcançados, talvez esta seja a principal lição a tomar, afinal de contas, se até um caracol pode chegar à disputa de Indianápolis, o que nos impede de seguir sonhos tão mais simples? Turbo constrói uma bela jornada, e surge como uma grata surpresa.
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